sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Obituário # 21: Lídia Rezende, por Larissa Soares


Disciplina e Odair José nunca são demais

Lídia Maria Rezende

Entre tintas, serragem, e cheiro forte de solvente, Lídia Maria passava tardes e mais tardes praticando artesanato.  Nem o câncer que venceu todos os tratamentos a impediu de entalhar, cortar, lixar, pintar.

Algumas dessas peças eram consideradas perfeitas pelos colecionadores. Outras, eram francamente horríveis e sem sentido, como diz Michele, sua filha. Ela ri ao contar que às vezes mentia sua opinião sobre o trabalho da mãe, que, no entanto, aos 57 anos, não se deixava enganar pelo elogio protocolar.

Na vizinhança, é fácil se ouvir falar da senhora que sempre estava cantando, com um lenço cor de creme envolvendo os cabelos cada vez mais roubados pela doença.

Vinda de Londrina com os pais muito nova, gastou boa parte dos anos de trabalho sendo professora de ensino fundamental. Duvidava que seus alunos se lembrassem de sua imagem, ou de suas broncas, mas a fama de “carrasca” se perpetuou. Julio Medeiros, vizinho da família enlutada, não esquece das duras palavras que ouviu quando foi aluno de Lídia, cujo lema era  “disciplina nunca é demais”.

Casada desde os 18, divagava que perdeu sua juventude mas mesmo assim era feliz. Mesmo quando se escondia do marido no quarto pra ouvir Odair José. Pouco antes de morrer lamentou que nunca teria netos, pois ninguém seria corajoso o suficiente para aguentar sua filha. Michele apenas ria da mãe e hoje confessa que ela tinha um pouco de razão.

Lídia não acreditava em nenhuma religião e que céu e inferno eram muito pouco pra ela. A criticidade irritava seu marido, que sempre fugia da discussão e abandonava a oficina onde a ajudava com as pinturas. Os vizinhos fofoqueiros também resmungavam, reprovando a posição da professora. Ela não ligava, dava um sorriso solto e lembrava que a cada um cabe a sua hora.

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